🔵🟢 Entre a Cruz e o Trono (filme 13/48)
- André

- 20 de set.
- 3 min de leitura
O que acontece quando fé e poder se encontram no mesmo corredor.

Vídeo/Imagem: site imdb
A série The Family na Netflix parece distante, mas soa familiar demais. Uma organização religiosa secreta, que age nos bastidores da política americana, justificando suas decisões em nome de Deus, como se o poder fosse um presente divino e não uma responsabilidade pública.
Impossível não pensar no Brasil. Aqui, o enredo pode não ser secreto, mas é igualmente preocupante. Em vez de reuniões discretas em mansões de Washington, temos templos gigantescos, transmissões ao vivo, cultos televisionados e marchas com milhares de pessoas. A forma muda, mas a essência é a mesma: transformar a fé em moeda política.
A série mostra como líderes americanos se apoiam na narrativa de serem “escolhidos por Deus” para governar. No Brasil, eu escuto esse mesmo discurso em cada eleição. Candidatos dizendo que “foi Jesus quem os colocou ali”, que “a missão é divina”, que “a vitória é para a glória de Deus”.
Por trás dessa retórica, o que existe é uma estratégia de poder. É a tentativa de blindar qualquer crítica. Porque quem ousa questionar passa a ser visto não apenas como adversário político, mas como inimigo da fé. Esse é o jogo mais perigoso: quando a religião deixa de ser espaço de liberdade e vira ferramenta de controle. E nesse ponto, a filosofia que guia o meu olhar — viver de forma honesta, transparente e sem máscaras — contrasta com essa realidade. Enquanto eles usam a fé como biombo, eu acredito que a espiritualidade deveria ser íntima, livre de interesses eleitorais.
O paralelo brasileiro com a série é assustador. Lá, existe o National Prayer Breakfast. Aqui, temos a Marcha para Jesus, usada como palanque político para candidatos e governantes. Não é coincidência que, em cada eleição, essa marcha se transforme em uma vitrine de promessas e alianças.
Outro exemplo é a bancada evangélica no Congresso Nacional, um dos grupos mais organizados e influentes da política brasileira. Eles não apenas votam em bloco, mas também pressionam governos e ministros. Nos últimos anos temos visto, mais fortemente, pastores como Silas Malafaia e Edir Macedo declarando apoio aberto a candidatos, mobilizando milhões de fiéis como se fosse um exército eleitoral.
Mais recentemente, acompanhamos escândalos envolvendo o Ministério da Educação, onde pastores foram acusados de intermediar recursos públicos para prefeitos em troca de apoio. Tudo em nome de Deus, com direito a oração e versículos bíblicos em reuniões oficiais. Esse é o retrato da fé usada como balcão de negócios.
E tem mais: líderes políticos brasileiros, incluindo presidentes da República, participam de cultos e eventos religiosos não só por convicção pessoal, mas porque sabem que dali sai voto. Já ouvimos discursos em que o presidente disse que “o Brasil acima de tudo e Deus acima de todos” não era apenas slogan, era uma senha para se conectar diretamente com milhões de eleitores religiosos.
No fundo, o que The Family denuncia nos EUA é o mesmo que acontece aqui: a captura da religião para legitimar projetos de poder. A diferença é que no Brasil o processo é explícito, televisionado, escancarado.
A avaliação é dura, mas necessária: quando religião e política se misturam desse jeito, quem perde é a democracia. Porque a democracia pressupõe igualdade de vozes. Mas quando um grupo se coloca como “escolhido por Deus”, automaticamente coloca todos os outros como menos legítimos. Isso é autoritário. E eu confesso: me incomoda demais ver líderes religiosos que, de um lado, pregam valores de moralidade, mas do outro, fazem alianças com corruptos, defendem interesses econômicos de suas instituições e pressionam o Estado para manter privilégios fiscais.
O discurso é de fé, mas a prática é de poder.
The Family é um espelho. Mostra que esse não é um problema só dos EUA, mas uma lógica global: usar Deus como álibi para governar. No Brasil, essa lógica se tornou parte do nosso cotidiano político. O risco? Transformar espiritualidade em fanatismo, e democracia em teatro religioso.
No final das contas, pra mim, a fé/espiritualidade é íntima demais para virar moeda política. Quando vejo púlpitos virarem palanques, tenho certeza de que perdemos algo essencial: a liberdade de acreditar sem ser manipulado.
Quando a fé se torna uma moeda política, a razão é a primeira a ser sacrificada.
É a fé cega que abre as portas para o fanatismo, transformando seguidores em um exército eleitoral e líderes em tiranos que se julgam divinos.
Avaliação pessoal (notas 0/10):
Direção: 8
Roteiro: 9
Fotografia: 6
Trilha Sonora: 6
Mensagem: 10
Nota Final: 8
Até! 🙏🏽 ✝ 🎦 👿




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